O professor Edson Xavier concede entrevista ao jornal Leia Sempre Brasil e define sua campanha e sua ação política. Fala sobre educação, cultura, movimento sindical e diz que quer defender no legislativo de Juazeiro do Norte as pautas da classe trabalhadora.
- Professor Edson Xavier, por que você lança agora sua pré-candidatura a vereador de Juazeiro do Norte?
Lanço minha candidatura porque acredito que é necessário enfrentar as propostas da extrema-direita que hoje pautam o debate político em boa parte do mundo. Acredito ser o momento de termos, depois de muito tempo, representantes dos movimentos sociais e sindicais na Câmara Municipal de Juazeiro do Norte. Alguém que estabeleça uma ligação entre as demandas desses movimentos e do povo trabalhador, a ação direta nas ruas e o que se discute lá dentro.
- Quais são suas pautas que deverão ser debatidas na campanha deste ano?
Os eixos centrais da campanha serão a educação, cultura e negritude. Todas essas pautas estão intrinsecamente ligadas às lutas da classe trabalhadora. Nossa luta passa pela valorização dos profissionais da educação e melhorias das condições estruturais das escolas. Em relação à cultura, é necessário o estabelecimento de recursos públicos para a pasta, a constituição de políticas de apoio aos mestres da cultura, assim como políticas de ocupação dos equipamentos do município. Quanto à pauta da negritude, procuraremos instituir leis que possam fortalecer as iniciativas antirracistas, tanto das instituições públicas quanto das organizações da sociedade civil.
- Como você avalia a participação da sociedade em um pleito municipal como este?
A participação popular nas eleições é muito importante, mas não pode se restringir simplesmente ao voto. É importante que as pessoas reflitam, elaborem, proponham e ajudem a construir os programas políticos que estão sendo discutidos. É importante também que se engajem para eleger seus representantes. Sabemos, no entanto, que o modelo de sociedade em que vivemos deixa pouco espaço para as pessoas se engajarem e até mesmo as desestimula nesse sentido. Precisamos remar contra a maré e compreender que a política, seja ou não em tempos de eleições, é incontornável.
- Como você avalia a luta das esquerdas e da sociedade brasileira contra o fascismo?
Tivemos uma grande vitória contra a extrema-direita quando elegemos Lula, derrotando Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2022. Essa mesma extrema-direita, ainda assim, não está morta e mostra força em várias partes do mundo neste momento. A ação das pessoas nas ruas, na organização dos movimentos antifascistas, assim como o enfrentamento no campo eleitoral, será fundamental para que possamos combater o neofascismo. Mas é necessário que a esquerda brasileira não minimize os perigos que esse movimento representa, que faça a disputa ideológica e busque a unidade nesse enfrentamento. A fragmentação, em um quadro como esse, só ajuda a fortalecer o neofascismo.
- Você, como sindicalista, como avalia o sindicalismo atual no Brasil e no Ceará?
O sindicalismo brasileiro sofreu o impacto de duas movimentações opostas nas últimas décadas. Com o PT no governo federal, houve uma atração das organizações sindicais para a esfera do governo. Grandes organizações do sindicalismo brasileiro passaram a estar umbilicalmente ligadas ao governo petista e abandonaram sua postura de enfrentamento às políticas do governo que feriam os direitos da classe trabalhadora. A partir do golpe que derrubou Dilma, os ataques aos direitos dos trabalhadores se intensificaram, e as próprias organizações sindicais foram feridas de morte com o fim repentino do imposto sindical. Isso, somado a um discurso ultraneoliberal que ataca os sindicatos e dissemina uma ideia de que eles são inúteis, corruptos ou perversos, enfraqueceu sobremaneira as organizações sindicais. Estas, no entanto, continuam existindo, organizando a classe trabalhadora e lutando. O Ceará reflete essa mesma lógica, com as dificuldades decorrentes do fato de que a informalidade e o trabalho precário têm um peso muito grande em todo o estado, dificultando a organização da classe trabalhadora em sindicatos.
- Você é professor da rede pública de ensino. O que dizer sobre a luta dos professores no momento atual?
Dentro do município de Juazeiro do Norte, o professorado é, com certeza, uma das categorias que mais luta. Lutamos constantemente pelo respeito à lei do piso salarial do magistério, assim como pela devida aplicação do Plano de Cargos e Carreiras, que foi a principal luta no município neste ano. Até então, o atual governo não tem respeitado o Plano de Cargos e Carreiras do magistério, havendo professoras e professores já com mais de três anos de espera para o enquadramento. Na grande maioria das escolas, os professores têm sofrido com calor dentro das salas de aula, sendo recorrentes casos de professores e alunos que passam mal devido ao calor. A gestão também teve um número muito elevado de denúncias de assédio moral. Nesse caso, a visão autoritária e distorcida do bolsonarismo em relação ao professorado e à escola deu o tom na relação prática entre diretores e coordenadores em muitas escolas da cidade.
- Como você analisa a gestão Gledson Bezerra?
A gestão de Gledson Bezerra, embora tenha se pintado como algo diferente das gestões anteriores, reproduziu o mesmo descaso com as necessidades da população. Em nenhuma das questões centrais da gestão pública municipal houve avanço significativo. Continuamos sem ter um hospital público municipal, mesmo sendo a maior cidade do Cariri. Continuamos tendo problemas críticos na educação, com um dos piores índices do estado, mesmo com um quadro profissional cada vez mais qualificado. Gledson Bezerra abriu portas para os ultraliberais e a extrema-direita na arena política municipal ainda como vereador. Agora, como prefeito, embora com um discurso mais polido e moderado, é a figura ao redor da qual essa extrema-direita gravita e deve utilizar como trampolim nas próximas eleições se ele for reeleito.
- Na atual gestão, como ficou a situação dos serviços públicos?
No que diz respeito aos servidores públicos, o governo de Gledson Bezerra é marcado por inúmeros casos de assédio moral nos diversos locais de trabalho, pela falta de flexibilidade quanto às negociações com os representantes dos trabalhadores e trabalhadoras, e um discurso de austeridade fiscal utilizado constantemente para negar direitos. Entre os servidores da educação, os professores esperam há mais de três anos serem enquadrados no Plano de Cargos e Carreiras. Professores que deveriam estar ganhando como doutores ou mestres estão ganhando como graduados, com uma perda remuneratória muito significativa. Funcionários da educação esperam a criação de seu PCCR, cujas negociações não avançam. Alguns outros setores, muitas vezes pequenos, pleiteiam reivindicações mínimas, mas que ainda assim não são atendidas, como é o caso dos coveiros, que é uma categoria muito pequena e luta pela majoração de seu adicional de insalubridade e pela melhoria de seus equipamentos de trabalho. A insatisfação dos servidores com o governo é enorme.
- Como servidor público, quais são as demandas da categoria e quais o prefeito Gledson resolveu? E como foi a relação de vocês com a atual gestão?
A relação dos servidores públicos com a gestão Gledson Bezerra foi e ainda está sendo muito difícil. Embora o governo afirme dialogar, de um modo geral, dificilmente houve negociação efetiva. As mesas de negociação eram mera formalidade, com o governo tentando impor de uma forma ou de outra suas propostas. O discurso de austeridade fiscal foi a tônica do governo com os servidores nesses últimos anos. Sabemos que se as demandas dos trabalhadores e trabalhadoras do município não forem pensadas dentro do orçamento público, nunca haverá espaço fiscal para essas demandas. No final, é tudo questão de vontade política, e dentro do discurso e da prática ultraliberal, esse espaço não existe.
- Caso você seja eleito, o que pretende levar como debate prioritário para o legislativo de Juazeiro do Norte?
Seguindo sempre a premissa de que um parlamentar socialista deve ser um tribuno da classe trabalhadora, sendo eleito, minha pretensão é estabelecer um vínculo do mandato com os movimentos sociais e sindicais, levando a pauta desses movimentos para dentro da câmara e mobilizando as pessoas em torno dessas pautas. Acredito que não há conquista efetiva sem mobilização de trabalhadores e trabalhadoras. Por ser um educador, negro e envolvido com os movimentos culturais da região, esses devem ser os focos da atuação parlamentar: educação, a questão racial e a cultura. Pretendo pensar em propostas políticas e organizar a mobilização em torno dessas pautas junto com os profissionais da educação, com os ativistas do movimento negro e moradores da periferia, e com os artistas, brincantes e ativistas da cultura.
- E para concluir, quem é o professor Edson Xavier?
Sou um militante socialista negro, professor de história há mais de vinte anos. Fiz graduação, especialização e mestrado na URCA, onde atuei como militante do movimento estudantil. Sou sindicalista, compondo o sindicato dos servidores municipais de Juazeiro do Norte, de onde, no momento, me licenciei para as eleições. Sou apaixonado pela arte, tendo organizado saraus, produzido poesia, experimentado desenho, pintura e fotografia, e já há alguns anos toco percussão com uma banda cratense. Sou pai da Nina e da Odara e, como elas, uma pessoa inquieta. Acredito que as pessoas devem poder aproveitar toda a riqueza social, cultural e material gerada pelo conjunto da sociedade. Essa é a ideia que me incomoda e me movimenta.
Leia o jornal Leia Sempre Brasil desta sexta 9/8: