No ano marcado pelas três décadas da morte de Leonilson (1957-1993) – pintor, desenhista e escultor cearense que é um dos nomes mais relevantes da arte contemporânea brasileira –, a Pinacoteca do Ceará realiza a exposição “Leonilson: Montanhas protetoras e ao longe, vulcões, rios, furacões, mares, abismos e Das amizades”. A abertura da mostra será no próximo sábado, 9 de dezembro, a partir das 16h. O acesso é gratuito.
A exposição reúne, também, trabalhos de Batista Sena, Efímia Meimaridou, Luiz Hermano, Siegbert Franklin, Zé Tarcísio, Marcus Francisco, Karim Aïnouz e Ricardo Bezerra, além de pinturas, desenhos, instalações e bordados de Leonilson, incluindo obras inéditas do artista. Cearenses ou radicados no Ceará, alguns desses artistas conviveram com Leó, como era chamado pelos amigos. Outros mantinham uma interseção artística com ele: ainda que não fossem próximos pessoalmente, o interesse pelo desenho, a pintura e os temas abordados na criação dialogavam com a obra de Leonilson. A curadoria é assinada por Aline Albuquerque e Ricardo Resende.
Além de visitar a exposição, o público é convidado a participar de uma homenagem ao artista. Também no sábado (9), a partir das 17h, no Pátio da Pinacoteca, haverá ao pôr-do-sol uma leitura de cartas do acervo pessoal de Leonilson por alguns de seus amigos. O momento terá, ainda, uma solenidade que celebra o primeiro aniversário da Pinacoteca do Ceará. Inaugurado em 3 de dezembro de 2022, o museu integra a Rede de Equipamentos e Espaços Culturais da Secretaria da Cultura do Ceará (SECULT CE) e é gerido em parceria com o Instituto Mirante.
A exposição
Composta por um total de 245 obras, a mostra tem a parceria do Projeto Leonilson, instituição cultural responsável pela pesquisa, catalogação e divulgação da obra do artista. Há, ainda, trabalhos de acervos do Museu de Arte Contemporânea do Ceará (MAC), do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), da Pinacoteca do Ceará e de coleções particulares.
Contemplando um largo período da produção de Leonilson, com obras que vão da década de 1970 até o ano de sua morte precoce, em 1993, a exposição apresenta 117 obras de Leo – outra forma carinhosa com que era chamado. Entre os destaques, estão desenhos e pinturas inéditas, produzidas no final da década de 1970 e começo dos anos 1980, que retratam a paisagem do Ceará. Em comum, os trabalhos trazem a natureza e seus fenômenos como equivalentes sensíveis das emoções que o artista costumava abordar de forma tão íntima e política.
Nascido em Fortaleza, em 1957, Leonilson mudou-se com a família para São Paulo ainda pequeno, mas sempre vinha à capital cearense para visitar amigos e familiares, que o recebiam num sítio no bairro Maraponga. Nas décadas de 1970 e 1980, Leo vinha com frequência e registrava em diários, agendas e cadernos vestígios de sua passagem e dos afetos que cultivava na cidade natal em desenhos.
Ícone para muitos artistas que se seguiram, Leonilson exerce forte influência sobre as novas gerações, comovendo o público de suas exposições, que o tem como referência. A mostra é dividida em dois núcleos, um com trabalhos de Leonilson e outro com as 137 obras “Das Amizades”, aproximando artistas com linguagens distintas que também trazem em seus traços, pincéis, linhas e sons as centelhas de uma produção viva e conectada às questões do seu tempo, que também era o tempo de Leo e ainda refletem o tempo de hoje.
A expografia, de Gisele de Paula, renova a ideia de uma montagem clássica de pinacoteca no núcleo “Das Amizades”, dispondo as obras quase sobrepostas. O pavilhão expositivo ganha outra atmosfera, ambientada por cores vivas e carregadas como o vermelho encarnado presente nas obras de Leonilson.
A exposição “Leonilson: Montanhas protetoras e ao longe, vulcões, rios, furacões, mares, abismos e Das amizades” fica em cartaz na Pinacoteca do Ceará até 26 de maio.
Sobre Leonilson
Pintor, desenhista e escultor brasileiro, Leonilson é um dos principais nomes da arte contemporânea no Brasil e internacionalmente, conhecido por sua obra singular e autobiográfica. Natural de Fortaleza, em 1957, mudou-se para São Paulo ainda criança e logo cedo começou a demonstrar interesse pela arte. Fez cursos livres na Escola Panamericana de Arte e depois ingressou no curso de Artes Plásticas da Fundação Armando Álvares Penteado. Na década de 1980, fez parte do grupo de artistas que retomou a prática da pintura, conhecido como “Geração 80”. Participou de importantes mostras no Brasil e no exterior, como Bienais, Panoramas da Arte Brasileira e a emblemática “Como vai você, Geração 80?”. O artista faleceu jovem, em decorrência do vírus HIV, na cidade de São Paulo, em 1993, aos 36 anos de idade. Deixou cerca de 4.000 obras, além de múltiplo acervo documental. Sua poética trata de sua existência e evoca sentimentos, alegrias, conflitos e dúvidas. Principalmente no final de sua vida, quando descobre ser portador do vírus HIV, aborda suas angústias, medos, a convivência com a doença e o impacto que ela causa na sua vida. Sua produção é considerada por críticos brasileiros e internacionais de grande valor conceitual para a arte no Brasil.
Sobre as amizades
José Tarcísio Ramos (Fortaleza, 1941) inicia seus trabalhos ainda muito jovem, aos 19 anos. No ano seguinte, viaja para o Rio de Janeiro depois de ter conhecido o renomado artista cearense Antonio Bandeira e passa a frequentar o Curso Livre de Pintura na Escola Nacional de Belas Artes. Em 1971, é comissionado por Walmir Ayala para ser um dos representantes brasileiros na VII Bienal de Paris. Em 1974, expõe no XXIII Salão Nacional de Arte Moderna, no Rio de Janeiro, e ganha o mais importante prêmio nacional, o de uma viagem ao exterior. Em 1976, seu trabalho “Regando Pedras” foi reproduzido em selo pela ECT. A escultura-instalação é uma das mais marcantes obras nacionais que denuncia a violência da ditadura em curso. Em 1982 volta à terra natal, monta seu ateliê e até hoje desenvolve ali sua carreira – uma das mais profícuas do Ceará. São seis décadas de carreira em que exerceu a liberdade plena. Com seu jeito de uma eterna criança, Zé Tarcísio tem nas memórias de infância, na religiosidade e na arte popular as características mais marcantes de sua obra, sempre orientado pelo olhar atento à realidade ao seu redor. Zé Tarcísio desde cedo se apaixonou pelo desenho, por meio do qual registrava criativamente o cotidiano, numa dinâmica que sempre se renova em sua vida. Aos 82 anos, o artista é atuante e figura presente na cena artística cearense.
Efimia Meimaridou Rôla nasceu em 1944 na Grécia. Radicada no Ceará desde 1961, é artista visual, artesã e pesquisadora. Graduada em Pedagogia (UFC), realizou mestrado em Sociologia do Desenvolvimento pela Escola de Altos Estudos das Ciências do Homem – Paris, França, no qual pesquisou a educação nos circos cearenses. Desde 1984 é pesquisadora-artesã em tipologias manuais de trabalhos têxteis como bordado, patchwork, tapeçaria e tecelagem. Publicou, em 1999, o livro “De Bordar e de Viver – Um Livro Para Rachel”, onde descreve seu processo criativo. Participou do 70⁹ Salão de Abril, da Prefeitura Municipal de Fortaleza, onde abriu seu ateliê para visita. Fundadora do Instituto Ecocult, atua como consultora, pesquisadora e professora. É mestre artesã do Projeto Comunidades Criativas, onde atua na formação de mulheres das comunidades do Poço da Draga e da Graviola, ambas na Praia de Iracema, na capital cearense.
João Batista Sena Filho (Camocim – 1952 – 2014). Compositor, líder da banda musical Chá de Flor e artista plástico cearense. Participou, junto com Leonilson, Marcus Francisco, Bené Fonteles, Zé Tarcísio, Siegbert Franklin, Luiz Hermano, entre outros, da renovação das artes plásticas no Ceará. Desenhista do surreal e do fantástico, Batista Sena em 1977 já figurava em exposições de expressivo significado no cenário nacional das artes visuais, como a exposição ”Panorama Atual do Desenho Brasileiro” promovida pelo Museu de Arte Moderna, de São Paulo, e a exposição “Os Caminhos da Arte Fantástica no Brasil”, promovida pelo Museu da Imagem e do Som, também de São Paulo. Chegou a representar o Ceará na exposição “Artistas Fantásticos do Brasil’, realizada no final da década de 1970 no Masp-SP, com curadoria de Pietro Maria Bardi.
Siegbert Franklin (Fortaleza – 1957 – 2011). Artista plástico, músico e ilustrador, inicia sua trajetória como artista visual no Salão do Crato de 1975. Na mesma época, participa da banda de rock “Perfume Azul”, com Mona Gadelha, Ronald Carvalho e Lúcio Ricardo. Em 1978 realiza a exposição individual “Feira das ilusões” na Galeria Antonio Bandeira. É premiado em alguns salões nacionais, entre eles, Salão Pernambucano de Arte, Salão do Paraná, Mostra de Desenho Brasileiro em Curitiba, Salão de Abril e Unifor Plástica. É convidado por Pietro Maria Bardi a realizar uma exposição de desenhos no MASP, em 1982. Sua obra desperta o interesse de críticos como Frederico de Morais e Walmir Ayala por apresentar características conceituais quando a tendência ainda era pouco observada na produção de jovens artistas. Inquieto, experimentou várias linguagens como a colagem, o vídeo, a fotografia, mas sempre se dedicou ao desenho, à gravura e à pintura. Viveu em São Paulo e na Alemanha e voltou a viver em Fortaleza a partir de 2006.
Marcus Francisco Cavalcante Alcântara (Fortaleza – 1950-1980). Artista plástico, exuberante no desenho com bico de pena, e pinturas a óleo, no estilo surrealista contemporâneo (décadas de 1960 e 1970), centrou suas manifestações em símbolos humorístico-filosóficos das questões humanas, exaltando o sexo sem barreiras como tema frequente em suas obras. Formou um legado de centenas de obras constantes em 24 exposições, entre coletivas e individuais no Ceará, Bahia, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Paris e Nova York. Arrebatou prêmios como o do Salão de Abril de 1970. Criou, também, centenas de quadrinhos criticando questões sociais ligadas ao consumismo, à religiosidade, à sexualidade e ao comportamento social coletivo, destacando fatos da vida que dialogam com os dias de hoje. Pôs esses trabalhos também sob a forma de tiras e revistas. Ainda foi premiado como compositor em edições do Festival da Música Cearense, tendo figurado ao lado de Raimundo Fagner, compondo a letra de “Nada Sou” e “Luzia do Algodão”, conquistando o primeiro lugar no IV Festival da Música Cearense de 1968. Conviveu com grandes artistas de sua época como Leonilson, Bené Fonteles, Zé Tarcísio, Siegbert Franklin, Luiz Hermano, Batista Sena e outros. Marcus Francisco é um tanto de tudo que o ser humano pode ter, dar e ser. Ou, como ele mesmo disse em 1976 na Casa de Cultura Raimundo Cela, durante a abertura de sua individual: “sou igual a todo ser humano. Desenhar é minha existência”.
Luiz Hermano Façanha Farias nasceu em 1954, em Preaoca, distrito de Cascavel, município do Ceará. No início dos anos 1970 estudou Filosofia na Universidade Federal do Ceará (UFC). Começou sua trajetória artística em 1977 na ocasião de sua primeira exposição individual no Náutico Atlético Cearense, em Fortaleza. Em 1979, já na cidade do Rio de Janeiro, cursou gravura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. No mesmo ano, transferiu-se para São Paulo e realizou a mostra “Desenhos”, no MASP. Em 1980 editou o álbum de gravuras intitulado “O Universo”. Na década de 1980, dedicou-se à pintura e desenvolveu sua carreira internacional. Em 1984, ao receber o Prêmio Chandon, foi para Paris, onde realizou uma exposição individual na Galeria Debret. Em 1983, participou da 5ª Bienal Internacional de Seul e da 2ª Bienal Pan-Americana de Havana, em 1986. Em 1987 expôs pinturas na 19ª Bienal Internacional de São Paulo e esculturas na 21ª edição do evento, em 1991. Nos anos 1990, realizou obras tridimensionais utilizando materiais diversos. Apresentou, em 1994, a mostra “Esculturas para Vestir”, no MAM-SP. Em 2005, participou da exposição “Discover Brazil”, no Ludwig Museum, Koblenz, na Alemanha. Em 2008, realizou a exposição “Templo do Corpo”, na Pinacoteca do Estado de São Paulo, quando publicou o livro: “Luiz Hermano”. Possui trabalhos monumentais em diversos espaços públicos: em São Paulo, nos jardins do MAC-USP, Cidade Universitária, no metrô, Estação República, e nos jardins do MAM-SP. Em Recife, capital de Pernambuco, a obra Mandacaru mede 7 metros e encontra-se exposta no Museu Cais do Sertão. Em 2018 realizou, em São Paulo, no Sesc Santo Amaro, a instalação “Trapézios”, que é a origem do álbum “XI Teoremas”, também lançado neste ano. Em 2019 realiza a individual intitulada “Cura-pinturas e objetos”.
Karim Aïnouz é um premiado cineasta, roteirista e artista visual. Estreou como diretor com MADAME SATÃ (Cannes Un Certain, Regard 2002). Seus outros trabalhos incluem MARINHEIRO DAS MONTANHAS (Seleção Oficial Cannes, 2021), NARDJES A. (Berlin Panorama, 2020), CENTRAL AIRPORT THF (Prêmio Anistia de Berlim, 2018), PRAIA DO FUTURO (Competição de Berlim, 2014), O ABISMO PRATEADO (Quinzena de diretores de Cannes, 2011), VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO (Veneza, Orizontti, 2009) e CÉU DE SUELY (Veneza, Orizontti, 2006). A VIDA INVISÍVEL, o último longa-metragem de Aïnouz, ganhou o prêmio Un Certain Regard no Festival de Cannes de 2019 e, desde então, já recebeu vários prêmios em todo o mundo. Aïnouz é mentor do Laboratório de Roteiros CENA 15 da Escola Porto Iracema das Artes/Instituto Dragão do Mar em Fortaleza e membro da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Ricardo Bezerra é arquiteto, compositor e músico, atuando nas artes cearenses desde 1966, quando participou dos primeiros festivais locais. Em 1968 foi um dos promotores da mostra musical “Aqui no Canto”, que teve como fruto o primeiro disco alternativo do Ceará. Ricardo Bezerra entrou com as parcerias “A História do Rapaz que Olhou para os Balões e Perdeu as Meninas”, com Luiz Fiúza, e “Unilateral”, feita com o poeta Brandão. Trabalhou na produção dos programas de TV “Gente que a gente gosta” e “Porque Hoje é Sábado”, dirigidos e apresentados por Gonzaga Vasconcelos. Em 1974, participa em Olinda do show “7 Cantos do Norte”, ao lado de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Fagner e Robertinho do Recife. Um ano depois faz apresentação no teatro do Ibeu, em Fortaleza, ao lado dos irmãos Caio e Gracco Sílvio, Francisco Casaverde, Tarcísio Lopes, Célio Loureiro e Petrúcio Maia. Em 1977 grava o LP “Maraponga”, com arranjos de Hermeto Paschoal e participação vocal de Amelinha. No lançamento, um ano depois, no Theatro José de Alencar, contou com Tarcísio Lopes, ngela Linhares, Descartes Gadelha, Cláudio Castro e Lázaro, entre outros. Cria e desenvolve o Relógio dos Sons, instrumento para estudo de harmonia, e faz turnê pelo Nordeste acompanhado de Pachelli Jamacaru e Renato das Neves. No final da década de 1970, Ricardo Bezerra participa do disco coletivo “Soro”, que reúne também Fausto Nilo, Cirino e Fagner, entrando em seguida num inexplicável recesso musical, passando a atuar diretamente na área de arquitetura. Passa a ensinar na Escola de Arquitetura da Universidade Federal do Ceará (UFC), faz mestrado na University of Arizona (EUA) e doutorado na University of Nottingham (Inglaterra).
Pinacoteca do Ceará
Inaugurada em dezembro de 2022, a Pinacoteca do Ceará tem a missão de salvaguardar, preservar, pesquisar e difundir a coleção de arte do Governo do Estado, sendo espaço de ações formativas com artistas, comunidade escolar, famílias, movimentos sociais, organizações não-governamentais e demais profissionais do campo das artes e da cultura. Trata-se de um espaço de experimentação, pesquisa e reflexão para promover o diálogo entre arte e educação a partir de práticas artísticas. Desde a abertura, já recebeu mais de 120 mil visitantes.
Serviço
O que: Abertura da exposição “Leonilson: Montanhas protetoras e ao longe, vulcões, rios, furacões, mares, abismos e Das Amizades”
Quando: Sábado, 9 de dezembro, a partir das 16h
Onde: Pavilhão expositivo 1 da Pinacoteca do Ceará (Rua 24 de maio, s/n, Centro)
Classificação indicativa: Livre*
Acesso Gratuito
Homenagem a Leonilson
Leitura de cartas ao pôr do sol, com amigos do artista
Quando: Sábado, 9 de dezembro, a partir das 17h
Onde: Pátio da Pinacoteca do Ceará
Classificação indicativa: Livre
Gratuito e acessível em Libras
*A exposição tem classificação indicativa livre. Obras que possam ser consideradas não recomendadas para crianças ou adolescentes estarão indicadas na sinalização do espaço.