
COLUNA O verbo Feminino por Iris Tavares
São 116 anos desde o nascimento de Antônio Gonçalves da Silva – Patativa do Assaré. Foi na serra de Santana no município de Assaré que o querido e o mais genial de todos os poetas da literatura de cordel fez seus versos brotarem. Quanta riqueza fez transbordar em cada dedinho de prosa que desfrutamos com essa lindeza de ser humano, uma experiencia que julgo ser um privilegio que dinheiro nenhum desse mundo é capaz de comprar. Desfrutar da sua presença, de cada verso que saltava de sua boca, dos seus olhos e de todo o seu ser que era feito de poesia. Quanta saudade meu poeta, afinal são 23 anos depois da sua última partida. Estamos privados de sua presença física, dos versos com cheiro de café saboreados à sombra do pé de flamboyant, naquelas tardes escarlates no terreiro em frente ao alpendre da casa de senhorzinho.
Foram diversas vezes que nos postamos nessa querença harmoniosa e no nosso amor pela poesia. Celebramos juntos com a família, amigas/os, nas rodas de conversas, nos recitais, festivais de cantorias por esse Nordeste a fora. Um prazer imenso estar na tua companhia, ao levá-lo para abrir o Salão de Poetas da Teleceará. Lembro-me com emoção da viagem que fizemos para inauguração do teatro Rachel de Queiróz em Guaramiranga e da doze de cachaça que tomamos para afugentar o frio e, na manhã seguinte, o poeta inverteu o laço do cadarço do seu par de sapatos. Caímos todos na risada. Sempre que possível fazia questão de acompanhá-lo nas viagens para os simpósios e eventos realizados pelas Universidades do eixo Nordeste. Ah! Poeta, tu me curaste de muitas coisas e me fortaleceste por dentro da alma, tornaste-me imune aos apelos materiais e fúteis que a vida besta nos oferece.
Confesso que foi grande a minha felicidade, quando estive do teu lado no teatro José de Alencar, no evento em que o ex-presidente FHC e o ex-governador Tasso Jereissati lhes entregaram a maior honraria da cultura cearense, a Medalha José de Alencar. Minha nossa! Quanta emoção, todavia, horas depois do evento me segredaste a tua insatisfação com aquele presidente “fingido”. E quando lhe contei sobre o motivo da minha rápida saída, até a entrada do teatro, para conversar com meus companheiros/as do movimento sindical que estavam mobilizados numa manifestação contra FHC e seu governo das privatizações, indagaste-me. O que eles lhe disseram? Patativa, eles queriam saber porque o poeta popular, defensor da reforma agrária, aceitara estar do lado de dois políticos neoliberais que governavam contra os trabalhadores e trabalhadoras. O que você respondeu? Que o poeta estava sendo homenageado com a Medalha José de Alencar, uma honraria fruto do reconhecimento e valorização da sociedade cearense, são raras as personalidades geniais, afinal só há um poeta Patativa do Assaré, ele é a voz e o sentimento do camponês ao denunciar as injustiças e fazer a defesa de uma nova sociedade pautada na igualdade e na justiça social. É justo e mais que merecido.
O poeta pegou na minha mão e saímos porta fora, enquanto o público nas galerias do teatro se levantava para ovacioná-lo. São memórias como essa que florescem todos os dias nos nossos corações e nos enche de amor e esperançar na história de vida daquele que foi e continua sendo um exemplo de superação entre o saber e o conhecimento. Parabéns meu querido poeta, hoje e sempre!