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Legenda: Na base governista, há indefinições até mesmo sobre a candidatura de Lula à reeleição | Foto: Ricardo Stuckert/PR
Enquanto petistas ganham projeção nacional e dominam Executivo, oposição ganha novos nomes e tenta avançar sobre um eleitorado historicamente de esquerda.
Atualmente, o Estado é o único em que a Capital é governada pelo PT, um feito que não ocorria há oito anos no País. A vitória de Evandro Leitão (PT) em Fortaleza também foi uma sinalização da força política daquele que atualmente é apontado por políticos e analistas como o líder do grupo governista: o ministro Camilo Santana (PT).
“O Ceará é extremamente relevante dentro da perspectiva regional, independentemente das lideranças políticas, é um Estado com protagonismo grande, com desenvolvimento na área de tecnologia e, além disso, tem as lideranças de destaque nacional. Antes, tinha ex-governadores, como o Ciro (Gomes), e agora o nome do Camilo tem grande destaque com um protagonismo refletindo no Estado”
O papel de Camilo Santana
Após oito anos à frente do Governo do Ceará — e uma aprovação recorde —, o hoje ministro da Educação conseguiu indicar o sucessor, Elmano de Freitas (PT), que foi eleito ainda no primeiro turno contra adversários de peso, como o ex-deputado Capitão Wagner (União) e o ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT).
Aliados também atribuem às articulações de Camilo o maior apoio recebido por Lula entre o primeiro e o segundo turno das eleições de 2022, passando de 65,9% para 69,9% no Estado. Naquele ano, inclusive, o ex-governador foi eleito para o Senado com quase 70% dos votos. Com a posse do presidente, ele assumiu o Ministério da Educação, pasta que tem um dos principais programas sociais lançados pela gestão federal: o Pé-de-Meia. O cearense, inclusive, aparece nos bastidores como possível candidato à Presidência em 2026. Possibilidade que ele nega sempre que questionado.
Outra liderança cearense com destaque no cenário nacional é o líder do governo Lula, o deputado federal José Guimarães (PT). O político já foi cotado para presidir o PT nacionalmente, no entanto, tem demonstrado mais interesse em disputar o Senado Federal.
Professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Emanuel Freitas pondera que a conjuntura local de forças indica um PT “superlotado” para 2026. Para o cientista político, isso pode dificultar as articulações da sigla, principalmente a nível local. A legenda domina a Prefeitura da Capital, o Governo do Ceará e a Presidência da República.
“Embora o Elmano seja o governador do PT e tenha o nome do PT, não podemos esquecer que o camilismo não é o mesmo que um petismo no Ceará, embora para a oposição seja. O camilismo é um arco de aliança muito grande, por conta disso, não acho que possa favorecer o nome do PT, favorece o nome do Elmano como continuidade deste projeto, que é um projeto amplo, governista, para além do PT”, aponta.
Seja pela presença dessas lideranças, seja pelo interesse eleitoral, Lula tem feito do Ceará um de seus principais destinos. Considerando as capitais, Fortaleza foi a quarta onde ele mais esteve neste mandato, com seis visitas. À frente da capital cearense estão apenas São Paulo (22), Rio de Janeiro (10) e Salvador (7). Esse placar, no entanto, deve mudar, já que Elmano anunciou uma nova viagem do presidente no fim deste mês para a inauguração do Hospital Universitário do Ceará.
Reduto da esquerda
De acordo com dados da Justiça Eleitoral, em 2022, o eleitorado cearense representou 4,59% dos votantes brasileiros para o cargo de Presidente da República, o maior valor em duas décadas. Historicamente, a esquerda tem ampla vantagem no Ceará, com apoio a candidatos do PT no segundo turno sempre acima de 70%.
Em 2002, Lula chegou a 71,78% contra Geraldo Alckmin (então no PSDB) no Estado. O tucano, que hoje é vice-presidente, ficou com 28,22%. Quatro anos depois, em nova disputa entre os dois, Lula chegou a 82,38% de apoio dos cearenses, com o tucano ficando com 17,62%.
A partir dali, nomes mais alinhados à direita ou à centro-direita foram ganhando espaço, ainda que longe de ameaçar a vantagem do PT entre os cearenses. Em 2010, Dilma Rousseff (PT) obteve 77,35% de apoio, já José Serra (PSDB) somou 22,65%. Na reeleição, a petista conseguiu 76,73%, já Aécio Neves somou 23,27%.
Em 2018, Fernando Haddad (PT) somou 71,11% e Jair Bolsonaro (então no PSL) totalizou 28,89%. No último pleito geral, pela primeira vez em duas décadas, um nome da direita chegou a 30% no Estado. Lula somou 69,97% e Bolsonaro ficou com 30,03%.
O desafio da oposição
Ainda que avance sobre o eleitorado, a oposição tem uma barreira de entrada no Ceará. Mesmo assim, desde as últimas eleições gerais, o grupo oposicionista passou por mudanças com a aproximação de antigos adversários e o surgimento de novos nomes competitivos em disputas majoritárias.
Mesmo quando era presidente, Jair Bolsonaro não tinha aliados competitivos no Estado. À época, o nome que mais se aproximava de ameaçar os petistas era o do ex-deputado Capitão Wagner (União). No entanto, ainda que figure no rol de aliados do ex-presidente, o político sempre oscilou entre momentos de aproximação e distanciamento das alas bolsonaristas.
Enquanto ocupou a Presidência, por outro lado, Bolsonaro intensificou as visitas ao Ceará na segunda metade do mandato, fazendo acenos a diversos setores sociais e anunciando obras estruturantes. No pleito de 2022, tais investidas se mostraram suficientes apenas para ele somar cerca de 30% de apoio do eleitorado local.
Somente em 2024 um aliado de primeira ordem do ex-presidente surgiu nas disputas majoritárias para ameaçar o grupo governista estadual. Nome mais próximo ao de Bolsonaro no Estado, o deputado federal André Fernandes chegou a 49,62% dos votos, contra 50,38% de Evandro Leitão. A diferença entre os dois foi a mais acirrada entre as capitais, uma diferença de 10,8 mil votos.
Mais que os números, André Fernandes conseguiu aglutinar entre seus apoiadores Capitão Wagner, que ficou em quarto lugar na disputa majoritária. Outro nome que apoiou o candidato do PL no segundo turno foi o ex-prefeito Roberto Cláudio, que desde 2022 passou a integrar a oposição no Estado junto ao ex-ministro Ciro Gomes. Nacionalmente, também há uma incógnita sobre o nome que irá aglutinar a oposição ao PT, já que Bolsonaro está inelegível.
A cientista política Luciana Santana aponta que, de fato, a direita ganhou território nos municípios nordestinos nos últimos anos. Contudo, ela pondera que isso não tem ressoado até agora nas disputas para a Presidência. “Tivemos candidaturas da direita e da extrema direita bem competitivas no último pleito, então, no âmbito municipal e nas disputas estaduais, vimos a direita crescer. Acontece que o comportamento do eleitor nas eleições presidenciais não segue essa direção, é um voto mais progressista, mais de esquerda”, pondera.
“Quando olhamos para os estados, vemos alguns perfis mais de centro que conseguiram se colocar, como a Raquel Lyra (PSDB), que venceu em Pernambuco, e o Fábio Mitidieri (PSD), governador de Sergipe. No âmbito municipal, tem uma centro-direita muito forte com o PSD, PP e MDB. Então, há comportamentos diferentes”, acrescenta.
O professor Emanuel Freitas também destaca o papel do “centrão” nas articulações locais. “É muito recente o fortalecimento e a expansão do eleitorado de direita porque temos uma tradição no Ceará e no Nordeste de um centrão que, nessas eleições (anteriores), esteve com os candidatos da esquerda, Lula e Dilma. A partir de 2018, esse centrão vai dando lugar a uma direita mais orgânica até chegar à extrema-direita. Então, eu não penso que seja uma composição do eleitorado à esquerda, é mais o aparecimento tardio de uma classe política identificada aberta e extremamente com a direita”, aponta.
O PDT na oposição
Alinhados à oposição, o grupo pedetista tem acumulado derrotas. Em 2022, o ex-prefeito disputou o Governo do Ceará e perdeu já no primeiro turno. À época, outra derrota contabilizada pelo PDT foi a de Ciro Gomes, que disputou a Presidência e ficou em quarto lugar, totalizando 3,04% dos votos no País, e em terceiro lugar no Ceará, com 6,8%, seu pior resultado nos pleitos locais. Para efeito de comparação, em 2018, Ciro havia recebido apoio de 40,9% dos cearenses no primeiro turno, deixando Haddad em segundo e Bolsonaro em terceiro no Estado.
“O Ceará tem essa especificidade histórica por ter um nome nacional de peso, mas, hoje, a situação do Ciro é outra. Ele perdeu o capital político, perdeu essa liderança”, afirma a cientista política Luciana Santana.
Em 2024, o grupo sofreu nova derrota com o terceiro lugar de José Sarto (PDT) na tentativa de se reeleger como prefeito de Fortaleza. Soma-se a isso a debandada de vereadores e prefeitos da sigla, além da saída de deputados estaduais e da promessa de desfiliação de deputados federais, desidratando o partido tanto ao nível local quanto nacional, conforme mostrou o Diário do Nordeste.
Para Emanuel Freitas, mais que qualquer outro nome da oposição, quem saiu mais fortalecido no Estado foi André Fernandes. “A oposição hoje tem o PDT, o Roberto Cláudio, o Ciro, então tem muita gente, muitos nomes e nomes com muito peso. Então, hoje, a grande questão a ser respondida é quem é que vai se constituir como líder oposicionista. Depois que isso for respondido, aí sim poderemos ver como é que ela chegará, se fortalecida ou pulverizada”, conclui.
Fonte: Diário do Nordeste