7 de outubro de 2024
pagina 6 noirdestinados a ler

Publicado em 2016, Bordados e alguns mosaicos, editora Mondrongo, é uma obra com quarenta e seis poemas da escritora pernambucana, mas radicada em Itabuna, Bahia, Fátima Soriano.

Para Aleilton Fonseca, escritor e ensaísta, a poesia de Fátima Soriano “é verbo que brota das vivências cotidianas”. Interessante ler isso, já que geralmente escuto pessoas falarem de sua dificuldade em ler poesia.

Em tempos de modernidades líquidas, individualismo, excesso de informações e avanço das novas tecnologias, é necessário plantar poesia para colher, quem sabe, mais afetividade entre os homens.

A leitura de Bordados e alguns mosaicos (2016) é importante para não nos esquecermos de quem somos e para não sermos engolidos pelo cotidiano. Poetas como Fátima Soriano nos mostram que a realidade tem como base a resiliência, em uma sociedade nada fácil de se viver e de (con)viver, mas possível por meio de bordaduras tecidas com força e determinação.

Bordados e alguns mosaicos (2016) traz um texto de apresentação “Lirismo e Sabedoria”, assinado pelo poeta João Filho, seguido de uma dedicatória: “Este livro é dedicado aos poetas viajantes na outra órbita da vida”. Acredito, assim como Soriano, que a vida tenha mais de uma órbita, ou seja, caminhos. Cora Coralina (1889-1985), poeta doceira goianiense, nos dirá: “Caminhando e semeando, no fim, terás o que colher”.

Em seguida, temos duas epígrafes: a primeira de um poeta, Friedrich Holderlin: “Um deus é o homem quando sonha / e mendigo quando reflete”; a segunda, de um filósofo, Martin Heidegger: “A linguagem é a casa do ser. Em sua morada habita o homem. Os pensadores e poetas são os guardiões da morada”.  Tanto as vozes do poeta como  do filósofo alemão convergem para um ponto em comum: somos linguagem. A poesia é linguagem. Logo, somos poesia, embora nem todos saibam disso.

A obra em apreço encontra-se dividida em duas partes: “Bordados” e “Alguns mosaicos”. Entre ambas, uma seção chamada “haicais” em que destaco: “Narcisos se multiplicam/ no grande espetáculo da Terra -/ haja espelho, haja plateia”. Não nos esqueçamos que Narciso morreu admirando a si próprio.

Na primeira seção da obra, “Bordados”, composta por trinta poemas, destaco uma em especial, “Impedimento”: “No meio do caminho / havia uma pedra / incompatível / como a de Drummond(…)”. Trata-se de um trabalho de intertextualidade, diálogo, com o poeta gauche do Modernismo brasileiro, autor de “No meio do caminho” (1928), poema que se transformou no pomo de discórdia entre os tradicionalistas e os modernistas. A repetição incessante do verso “No meio do caminho” reproduz o eterno enfrentamento dos obstáculos (pedra) na vida (caminho) do indivíduo. Foram tantas as críticas em torno desse poema, que Drummond acabou por juntá-las e, no ano de 1967, nascia:  Uma pedra no meio do caminho – Biografia de um poema.

Na segunda seção, “Alguns mosaicos”, com quinze poemas, destaco “Esfinge”: “Para os amigos tenho sempre/ um abraço sincero -/ como o de uma criança. / Aos que tem desdém/ tenho sempre um sorriso – o da Mona Lisa”. As pessoas queridas, afetos; as (não) queridas, um riso enigmático, tal a obra do pintor Leonardo da Vinci (1452-1519).

Bordados e alguns mosaicos (2016) é uma obra para ser lida à tarde sorvendo um café, ou no fim da noite com uma taça de vinho, por um leitor (a) que, apesar das pedras no caminho, esteja firme em sua jornada.

Coluna Nordestinados a Ler no Jornal Leia Sempre Brasil:

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