20 de setembro de 2024

Foto: Reprodução/Redes Sociais

A obra Chuva Secreta, publicada em 2013, da autora e professora da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Állex Leilla, nascida em Bom Jesus da Lapa, é composta por nove contos permeados pela simbologia da chuva.

Chuva é o símbolo da fecundidade e da fertilidade. É o elemento que promove reflexões, descobertas, autoconhecimento e desfechos esperados/inesperados, cabe ao leitor inferir, na obra leilliana.

A autora que coleciona citações e epígrafes, abre o livro com trechos de poemas. O primeiro, “Cai chuva do céu cinzento”, do português Fernando Pessoa, o segundo, Canto I – XXV – “Qualquer que seja a chuva desses campos”, do modernista Jorge de Lima e, por fim, somos presenteados com os versos do jornalista e sociólogo, Alberto da Cunha Melo: “Toda matéria ou toda força / sofre de eterno desperdício, / quer ser azul e temporário/ e as borboletas sabem disso […]”. Ou seja, estamos diante de uma obra em prosa perpassada pela poesia. Além disso, dos nove contos presentes nesta coletânea, todos são antecedidos por trechos de escritores dos quais seis são poetas.

Em seguida, és a dedicatória da obra: “Para meus pais, manos e manas, partes de tudo que sou; para João Filho, minha chuva secreta e ininterrupta”. Leilla e o autor de A dimensão necessária (João Filho) – livro com uma dosagem metafísica – prêmio Biblioteca Nacional em 2015 – são casados há duas décadas.

Finalmente, os contos se iniciam. O primeiro deles se chama “O gato que ri”, um drama familiar tão difícil de ser digerido pelo protagonista que acaba por deixá-lo com problemas de visão. No segundo, “Senhora minha”, com epígrafe de Luís Vaz de Camões, um dos escritores preferidos da autora, temos uma história de encontro/desencontro entre uma mulher e um homem que acredita em alma gêmea. Dedicado a Renato Pedrecal Jr, músico e poeta, autor de Concerto para violoncelo e pássaros (2019), o terceiro texto, intitulado “Conexo” traz à tona o desejo de uma mulher entre lê um livro e seduzir a vizinha do apartamento em frente. O quarto conto, “Quando estávamos nos mesmos arvoredos”, com epígrafe de Ricardo Reis, discute em um tom filosófico, as relações humanas e sociais: coletividade e individualidade. Logo após, com epígrafe de Manuel Bandeira, o conto dedicado ao jornalista e professor, Suênio Campos de Lucena, chama-se “O que sobra do azul quando é breu”. É uma espécie de carta de amor de um homem apaixonado ao seu parceiro que o abandonou para viver uma aventura no Oriente. O mais longo dos contos intitula-se “O eixo e a sombra” e é dedicado às amigas amadas: “Adriana Telles, Ananda Amaral e Arla Coqueiro”.  O texto é forjado em quatro eixos temáticos: 1) a dor da perda de uma pessoa querida, 2) o conflito ético entre publicar e não publicar o espólio da amiga falecida, 3) a dificuldade de manter uma única posição ideológica em uma sociedade dinâmica e de relações líquidas, 4) a dificuldade de se saber, se reconhecer enquanto sombra ou duplo.  O sétimo texto, “Felicidade não se conta”, foi vencedor do 20º Concurso Nacional de Contos Luiz Vilela, em 2020, em Minas Gerais.  Com temática homoerótica, a narrativa se passa em uma Maceió chuvosa e alagada, mostrando o cotidiano de dois artistas – um poeta e um pintor.  O conto seguinte parece nome de poesia – “Não se esqueça de pisar firme no coração do mundo” – foi selecionado para a  Antologia Wir Sind Bereit, publicada na Feira de Frankfurt, Alemanha, em 2013. A discussão gira em torno da feiura – “uma desgraça sem conserto”.  O último texto, “Epiceno”, dedicado a Alex Simões, “o poeta dos olhos verdes”, autor de assim na terra como no selfie (2021), gira em torno de uma personagem que não se sente nem homem nem mulher, mas um ser humano epiceno, que sente a dor e o abandono da pessoa amada, um poeta profissional, que vai participar de um congresso.

Chuva secreta (2013) é uma obra do realismo contemporâneo pautado nas relações humanas, que tem na chuva o símbolo de transformação/questionamento/autoconhecimento/encontros/desencontros.

 

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