Investigadores da Polícia Federal (PF) estão focando em pelo menos duas linhas de apuração relacionadas à tentativa de golpe de Estado por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que podem estar conectadas aos ataques aos três Poderes promovidos por bolsonaristas em 8 de janeiro de 2023.
Uma das vertentes cruciais, segundo a PF, é uma conversa do general Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice na chapa de Bolsonaro, conforme informações do jornal Folha de S. Paulo.
Nessa conversa, Braga Netto sinaliza a possibilidade de permanecer no poder mesmo a quatro dias do fim do mandato do ex-presidente. A atuação do militar junto a milícias digitais também é considerada relevante pelos investigadores.
Conforme relatório da PF, em 27 de dezembro de 2022, Braga Netto recebeu uma mensagem de Sérgio Rocha Cordeiro, assessor de Bolsonaro, questionando onde poderia deixar o currículo de uma mulher. A resposta do general foi: “Cordeiro, se continuarmos, poderia enviar para a Sec. Geral. Fora isso vai ser foda”. A mensagem foi encontrada no celular de Cordeiro.
Os investigadores interpretam que esse diálogo indica a persistência de esperança por parte de Braga Netto de que o grupo de Bolsonaro permanecesse no poder. Além disso, a PF destaca que o próprio Braga Netto utilizava o “gabinete do ódio” e orientava as milícias digitais com o objetivo de incitar outros militares a aderirem ao golpe e, ao mesmo tempo, atacar a imagem de militares que resistiam ao intento golpista, conforme apontado no relatório.
Uma crítica específica de Braga Netto foi direcionada ao general Marco Antônio Freire Gomes, então comandante do Exército, por sua recusa em aderir à tentativa de golpe. A PF identificou uma mensagem de Braga Netto para Ailton Barros, militar expulso do Exército, na qual o ex-candidato a vice culpou Freire Gomes pela posse de Lula, chamando-o de omisso e indeciso.
“Meu Amigo, infelizmente tenho que dizer que a culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do Gen FREIRE GOMES. Omissão e indecisão não cabem a um combatente”, escreveu Braga Netto. “Oferece a cabeça dele. Cagão.”
Paralelamente, membros da PF ressaltam uma negociação encontrada em conversas entre o tenente-coronel Mauro Cid sobre o pagamento de R$ 100 mil ao major das Forças Especiais do Exército, Rafael Martins de Oliveira. O propósito seria custear despesas de manifestantes em Brasília.
A troca de mensagens ocorreu em 14 de novembro de 2022, após as eleições e antes da manifestação antidemocrática promovida em Brasília em 15 de novembro, dia da Proclamação da República, em frente ao quartel-general do Exército.
Na perspectiva da PF, esse diálogo evidencia que militares da ativa e membros do antigo governo “estavam oferecendo suporte material e financeiro para manter as manifestações antidemocráticas mobilizadas, com o objetivo de criar uma falsa sensação de apoio popular à tentativa de golpe”.
Segundo o relatório policial, o diálogo forneceria uma estimativa de gastos para “possivelmente, financiar e direcionar” os eventos ocorridos em Brasília em novembro e dezembro de 2022.
Para os investigadores, isso não apenas revela a tentativa do círculo próximo ao ex-capitão de manter a militância organizada para questionar o resultado das urnas, mas também sugere que integrantes das Forças Especiais do Exército poderiam ter orientado a atuação dos manifestantes em 15 de novembro de 2022.
Kids pretos
Os integrantes das Forças Especiais, conhecidos como “kids pretos” no Exército, desempenharam um papel crucial na amplificação dos eventos de 8 de janeiro, de acordo com a perspectiva dos investigadores. A participação deles nos atos terroristas é tratada como uma prioridade nas investigações.
Este grupo das Forças Armadas é especializado em guerras não convencionais e possui conhecimento em técnicas de guerrilha, por exemplo.
A PF está averiguando se o pagamento foi efetuado e espera que Mauro Cid explique as circunstâncias dessa transação, uma vez que esse caso não foi abordado em sua delação premiada. Há suspeitas por parte dos policiais de que recursos da Presidência da República possam ter sido utilizados nessa ação.
Além da troca de mensagens pelo celular, a PF identificou um encontro entre Cid e Rafael dois dias antes dos eventos, conforme aponta a investigação.
Na decisão em que autorizou diligências contra Bolsonaro, aliados e militares, o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), descreveu a perspectiva da PF sobre essa transação.
“Segundo a autoridade policial, esses elementos, em corroboração com outros, revelam indícios de que o major Rafael Martins de Oliveira atuou de forma direta no direcionamento dos manifestantes para os alvos de interesse dos investigados, além realizar a coordenação financeira e operacional para dar suporte aos atos antidemocráticos e arregimentar integrantes das Forças Especiais do Exército para atuar nas manifestações.”
Fonte: site Diário do Centro do Mundo