Neste 3 de novembro o Brasil deveria comemorar com toda pompa o fato de que neste dia no ano de 1930 era instituído o direito de voto da mulher brasileira. Isso não se deu pelo fato de os políticos homens serem bonzinhos, mas muita luta das mulheres foi necessária. Passados quase 93 anos da instituição do voto feminino, a percepção que se tem é como o Brasil trata mal as mulheres. Os índices de violência, o feminicídio e as dificuldades para a mulher permanecer e atuar na política são sinais de uma sociedade ainda machista.
Os índices de violência não deixam dúvidas. 35 mulheres foram agredidas física ou verbalmente por minuto no Brasil em 2022. 28,9% (18,6 milhões) das mulheres relataram ter sido vítima de algum tipo de violência ou agressão, o maior percentual da série histórica do levantamento. 14 mulheres foram agredidas com tapas, socos ou chutes por minuto. Quase 6 milhões sofreram ofensas sexuais ou tentativas forçadas de manter relações sexuais. Quase 51 mil mulheres sofreram violência diariamente em 2022, o que equivale a um estádio de futebol lotado. 4 vezes é o número em média de agressões sofridas no período. Entre as mulheres divorciadas, a média é de 9 agressões. 45% das mulheres vítimas de violência não fizeram nada após sofrer o episódio mais grave.
Os dados acima publicados no site do Instituto Patrícia Galvão por si só revelam o alto grau de violência que as mulheres estão expostas no Brasil. Sem falar nos casos de impunidade que proliferam. A impunidade, aliás é amiga dessa violência, pois muitos agressores sequer são presos após os atos e delitos praticados contra mulheres.
O boletim do Observatório da Mulher contra a Violência (OMV) publicado no site do IPG mostra que no ambiente político há muita discriminação contra as mulheres. A pesquisa aponta que existe uma relação entre o nível do cargo pretendido e a violência e discriminação. Nas esferas mais altas, Estaduais e Federais, mais se observa a ocorrência de violência em relação aos distritais. Trinta e dois por cento das mulheres (cargos municipais) afirmam ter sofrido discriminação em razão do seu gênero. Já no caso dos cargos estaduais e federais, 44 por cento das mulheres afirmam ter passado por tal situação. A situação se inverte em relação aos homens.
O boletim Elas vivem: dados que não se calam, lançado em março deste ano pela Rede de Observatórios da Segurança, registrou 2.423 casos de violência contra a mulher em 2022, 495 deles feminicídios. São Paulo e Rio de Janeiro ficaram com os números mais preocupantes, concentrando quase 60% do total de casos. Essa foi a terceira edição da pesquisa feita em sete estados: Bahia, Ceará, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e Piauí, os dois últimos monitorados pela primeira vez.
A luta das mulheres conseguiu em muitos momentos reverter quadros difíceis. No ano de 1930, por exemplo, a mulher ganha após muita luta o direito ao voto, mas o primeiro voto se deu em 1932. Desde o final do século XIX no Brasil que existia uma luta pela participação da mulher na política.
A discussão sobre o voto feminino no Brasil data do final do século XIX. Foram registradas tentativas de alistamento de mulheres para votação na época, mas todas foram negadas. Durante a Constituinte de 1890, a discussão foi intensa, mas todas as propostas de incluir o sufrágio feminino na nova Constituição foram derrotadas, com a justificativa de que com ele, seria decretado o fim da “família brasileira.”
Com a proclamação da República, o periódico “A Família”, de Josefina Álvares de Azevedo se tornou um veículo de propaganda do direito ao voto. Josefina passou a publicar artigos afirmando que sem esse direito, a igualdade prometida pelo regime republicano não seria alcançada.
A luta pelo direito ao voto ganha mais força no início do século XX. Em 1910, a educadora Leolinda Daltro funda o Partido Republicano Feminino, após ter seu pedido de alistamento eleitoral negado. Leolinda era uma mulher desquitada, que criou seus cinco filhos separada do marido e muito ativa politicamente. Por sua atuação, foi apelidada de “mulher do diabo.”
Inspirado no movimento sufragista inglês, o PRF organizava passeatas para reivindicar o direito ao voto e condições dignas de trabalho e educação para as mulheres brasileiras. O partido se tornou a primeira organização a liderar a luta pelo sufrágio feminino no Brasil. Posteriormente, foi substituído pela Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, criada por Bertha Lutz.
Após intensa campanha nacional, o voto feminino e secreto foi introduzido no Código Eleitoral Provisório de 1932, elaborado no governo de Getúlio Vargas, dois anos após a Revolução de 30. Segundo a legislação, era eleitor “o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo”, alistado conforme determinava a lei.
Somente em maio de 1933, na eleição para a Assembleia Nacional Constituinte, a mulher brasileira pode, pela primeira vez, exercer o direito de votar e ser votada em âmbito nacional. Naquele ano, a médica paulista Carlota Pereira de Queirós foi a primeira mulher a ser eleita deputada federal da América Latina. Ela também foi a única mulher eleita para compor a Assembleia Nacional Constituinte de 1934.
O Código Eleitoral de 1932 só permitia que votassem ou fossem votadas as mulheres casadas com o aval do marido ou as viúvas e solteiras com renda própria. O Código de 1934 retirou essas determinações, mas o voto feminino continuou sendo facultativo, com a obrigatoriedade prevista apenas para os eleitores homens. Apenas em 1946 o voto passou a ser obrigatório também para as mulheres.
As mulheres são maioria da população. As mulheres são, pela primeira vez em cinco décadas, maioria em todas as grandes regiões do Brasil. Faltava apenas a Região Norte para consolidar a tendência histórica de predominância feminina. Não falta mais, segundo o Censo Demográfico de 2022, que teve novos resultados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O país tem uma população residente de 203.080.756. Deste total, 104.548.325 (51,5%) são mulheres e 98.532.431 (48,5%) são homens. O que significa que existe um excedente de 6.015.894 mulheres em relação ao número de homens. O IBGE considera, para fins de registro, o sexo biológico do morador atribuído no nascimento.
Mas a luta não para. E neste 3 de novembro lembrar as lutas atuais das mulheres brasileira por maior participação na vida política do Brasil. Como já dissemos há ainda muita discriminação nesse espaço e as mulheres agora lutam por ampliar bancadas que lutem por seus direitos.
Fonte: site do Instituto Patrícia Galvão, site da Agência Brasil e do TRE Goiás